SENHOR... O SERTÃO
ESTÁ MORRENDO
João Eudes Costa
O
sertão está em desespero, com o sol abafadiço queimando, sob nosso olhar
tristonho, as esperanças depositadas nas plantações, que também tombam
estorricadas pelo hálito morno da terra que se arde em febre.
Senhor, por que tanto sofrimento? Por que sofremos
tamanho castigo? Se O ofendemos com tanta veemência, se nossos pecados foram
tamanhos, mostra-nos, de uma vez, o caminho certo a seguir, pois jamais tivemos
o propósito de ofendê-lo.
Estamos aflitos porque não queremos perder
a fé, que nos faz resistir a todos os percalços. A confiança em sua proteção
transforma nossa fragilidade em intransponível muralha de pedra. Não queremos,
pois, perder nossa única fonte de esperanças. Não nos deixe Senhor. Aceitamos a
reprimenda pelas nossas faltas, mas não temos forças para resistir ao vazio de
Seu abandono.
Nossas
plantações, SENHOR, estão morrendo. Nossos açudes secos, e os animais caminham
inquietos nos campos sem forragem, com fome e com sede. Nosso trabalho, nossos
esforços, nossas esperanças, foram esmagados pela fatalidade da
seca.
Não
permita Senhor que os nossos destinos fiquem na dependência de planos elaborados
por homens incapazes, sem consciência, ambiciosos, indiferentes aos nossos
sofrimentos. Estamos entediados de tanta angústia, nossa paciência também deve
ter limite.
As
injustiças, mesmo que não queiramos, tenderão a indicar outros caminhos,
inclusive o da violência. Por mais que queiramos suportar. Por maior que seja a
nossa resignação. Por mais tolerantes que queiramos ser, haveremos de, um dia,
nos deixar envolver pela revolta, a exemplo do que Lhe aconteceu, quando teve
que reagir à imprudência dos mercadores, que profanavam o templo de Seu
Pai.
Volte
SENHOR os olhos para este sertão. Venha, novamente, em socorro desta gente.
Perdoe, mais uma vez, as nossas ofensas, os nossos pecados, e as nossas
profanações. Não nos expulse desta terra seca, onde sofremos, mas a amamos com
toda a força de nossa alma.
Não
permita que este solo seja apenas molhado pelas lágrimas dos que partem para
outras plagas, onde irão sofrer muito mais. Não permita que esta terra seca seja
umedecida somente pelo pranto dos que teimam em aqui permanecer, agarrados ao pó
que se levanta à passagem dlos retirantes.
Se
tanto pecamos; se O ofendemos a ponto de merecer tamanho castigo, perdoa-nos,
Senhor. Se nós chegamos ao desespero e se a revolta superou a fé, foi porque
estamos exauridos de tanto massacre, tanta injustiça e de tanta coação, vencidos
pela sanha de nossos implacáveis algozes.
Se
agredidos pelos poderosos da terra, venha, SENHOR, em nosso auxílio. Deixe a
chuva cair para amenizar esta febre que aquece a terra, queima as nossas
plantações, secam as nossas fontes de água, e nos vai matando pouco a pouco. Se
não merecemos compaixão, tenha piedade dos animais que sofrem as conseqüências
da maldade da terra, e se aglutinam em torno de nós, para sofrerem também, para
chorarem e morrerem conosco, castigados pela terrível seca.
Se
nossa fraqueza, nossa maldade superam o limite da tolerância e se nossas faltas
merecem tamanha punição, rogamos pelas crianças que, na sua inocência, brincam
com as bonecas de milho que não frutificaram. Que secaram pela inclemência do
sol, pela falta de chuvas. Aquela criança sentar-se-á em vão, em torno de uma
mesa, que há muito está e continuará vazia. Quando a fome chegar com maior
intensidade, as crianças são as que mais irão chorar, Sentindo
falta da boneca de milho que se desfez em suas mãos, como a colheita que
desapareceu após se constituir na grande esperança do
agricultor.
Senhor, nesta hora difícil, olha para o meu sertão.
Permita também que anjos e santos também volvam o olhar para esta terra que se
arde na fogueira do desespero. Olhando-nos do céu, terão compaixão de nosso
sofrimento, e, juntos, chorarão a nossa dor. As lágrimas descerão pelas nuvens,
molharão a terra, cairão sobre as plantações, os campos renascerão e tudo ficará
alegre.
Somente assim veremos partidos os grilhões que já nos
prendem os pulsos. Com nossas mãos livres, nossos pecados perdoados e com a
ajuda da bendita chuva voltaremos ao amanho da terra para renovar nossas
esperanças. Crianças contentes, animais pastando fartamente, os pássaros haverão
de voar bem alto levando a nossa mensagem de fé, de esperança e gratidão. Na
terra ficarão homens que tocam no peito agradecendo e com olhos fitos no céu
dirão, respeitosamente: OBRIGADO SENHOR.
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