segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Africanos veem famílias inteiras morrerem por causa do ebola



Erison Musa Turay, 24, desempregado, que viu 12 membros de sua família morrerem por causa do ebola (Foto: Avener Prado/Folhapress)
Faz uma semana que Alhassan Kemokai, 34, saiu da ala de segurança máxima do hospital de Kenema. Ele contraiu ebola, mas sobreviveu.

Entre 60% e 65% das pessoas infectadas pelo vírus acabam morrendo. Não há vacina, nem tratamento específico, só paliativo.

Para aqueles poucos sortudos que sobrevivem, a vida não é fácil.

Kemokai não sabe se ainda tem emprego na ONG de desenvolvimento agrícola em que trabalhava. Ele tem um certificado do hospital de Kenema atestando que está livre do vírus ebola. Mas seus chefes estão com medo.

Ele contraiu o ebola de sua mãe, que trabalhava na ala de fisioterapia de uma clínica. Quando ela adoeceu, ele foi visitá-la.

A mãe estava muito fraca, ele lhe deu a mão e a ajudou a levantar. "Eu até desconfiei que fosse ebola, mas não se pode negar a mão à sua mãe", contou.

Sua irmã mais nova, seu sobrinho de dez meses, seus irmãos e uma prima ficaram doentes. O sobrinho e a prima morreram.

Três dias depois da morte de sua mãe, Kemokai começou a ter febre e dor de cabeça. Tomou paracetamol e não adiantou. À noite, começou a ter diarreia.

Foi para o hospital. "Andei 2,5 km. Não podia pegar ônibus porque sabia que era ebola e ia acabar passando para alguém", contou.

Foram 14 dias na área de isolamento do hospital. Tinha febre alta, muita diarreia e vomitou quatro dias seguidos. Viu muitas pessoas morrerem ao seu redor.

"Fui ao banheiro e, quando voltei, meu vizinho de cama, que era técnico hospitalar, estava morto ao meu lado", conta.

No dia em que recebeu alta, quatro pessoas morreram. Deixou no hospital suas roupas, seu celular e seu sapato. Foi tudo queimado.

Mas apesar de ter seu certificado de alta, o estigma é muito grande.

Sua mulher não encosta nele. "Ela põe o copo d´água em cima da mesa, pra não chegar nem perto". Ninguém no bairro em que vive se aproxima dele.

O leonês Alhassan Kemokai, 34, mostra documento fornecido por hospital que atesta que ele se curou da doença (Foto: Avener Prado/Folhapress)

FAMÍLIA DIZIMADA
Erison Musa Turay, de 24 anos, perdeu a família toda para o ebola. A irmã veio doente de um vilarejo em Kailahun. Infectou mãe, pai, cinco irmãs, quatro irmãos. Todos os 12 morreram.

Hoje, Turay vive sozinho em um cômodo alugado. Vende roupas no mercado. Ganha cerca de US$ 50 por mês.

Eu não sei de onde vem essa doença. Só sei que minha vida agora é ruim. Eu choro muito", disse. Ele passou 28 dias no hospital.

Dos 352 pacientes com ebola admitidos no hospital de Kenema este ano, 204 morreram. Além disso, 15 médicos e enfermeiras morreram ao cuidar dos pacientes. Entre eles, Sheik Umar Khan, o principal especialista em ebola do país, que tratou mais de 100 doentes e se tornou herói nacional. Faixas com sua foto estão por toda parte no hospital de Kenema. "O vírus do ebola não perdoa", diz o chefe médico do distrito de Kenema, Mohamed Vandi.

O momento de maior risco de contágio é quando o vírus acaba de matar uma pessoa –por isso, tanta gente foi contaminada ao fazer os enterros tradicionais, que envolvem preparação do corpo. A Cruz Vermelha promove os chamados enterros seguros, em que o corpo é acondicionado em sacos especiais por equipes de saúde, vestidas com equipamento de alta segurança.

Também se pode contrair a doença ao encostar em objetos que tiverem saliva, sangue, vômito ou outras secreções infectadas. Mas, fora do corpo humano, em objetos tocados por doentes, o vírus sobrevive por poucas horas.

De acordo com a maioria dos estudos, quando o paciente é assintomático, não há transmissão.

"Está difícil de controlar porque as pessoas escondem os doentes em casa, não levam para o hospital. Para quebrar a cadeia de contaminação, teríamos que monitorar todas as pessoas que tiveram contato com doentes de ebola, mas não temos gente suficiente."

Desde que iniciaram o programa em que pessoas avisam anonimamente sobre a presença de pessoas com ebola escondidas nas casas, aumentou muito o número de casos notificados, diz Vandi.

A Cruz Vermelha está construindo um hospital de ebola em Kenema, já que a previsão é que a epidemia ainda dure pelo menos seis meses.

Fonte: Foha de São Paulo

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