PEITO LAVADO
Clerisvaldo B. Chagas, 14 de fevereiro de 2014 - Crônica
Nº 1140
Tudo começou em tempo de eleição. A cidadezinha dividia-se em dois partidos políticos. Durante os comícios dos dois candidatos a prefeito, Candinho, o proprietário da burra de carroça por nome Aurora, notou que o animal ficava excitado e queria sempre acompanhar os discursos de um deles. Logo correu o boato de que a burra era inteligente e queria votar.
Ilustração - (Gazeta de
Beirut)
A casa de Candinho estava sempre cheia de gente querendo
conhecer e falar com ela, ali no terreno vizinho. Quando indagavam se o
candidato “A” iria ganhar a eleição, a burra ficava impassível. Quando
perguntavam sobre o candidato “B”, Aurora balançava a cabeça para cima e para
baixo.
O candidato “B” foi à casa de Candinho conhecer a burra
dos boatos. Aurora ficou muito alegre com sua presença, saiu pulando,
escoiceando e por fim veio esfregar o focinho no candidato de sua preferência. O
homem disse que queria comprar a burra pelo preço que o proprietário pedisse.
Candinho não quis vender. Diante disso, o político mandou colocar uma vistosa
saia na burra, levou uma cabeleireira e maquiadora até à casa de Candinho e
preparou Aurora como se fosse mulher para levá-la ao seu próximo
comício.
O candidato “A” soube e também foi procurar Aurora. A
burra saiu correndo e não quis ouvir o político.
Diante do número de eleitores que a cada dia lotava a
casa de Candinho para conhecer e pedir conselho a Aurora, o candidato “A”
contratou o jagunço Mané Gancho para matá-la. O terrível jagunço dirigiu-se ao
cercado de Aurora, durante a madrugada, levando uma espingarda 12. Aurora,
percebendo o perigo, aproximou-se do bandido e passou-lhe a língua na face. O
bandido ficou apaixonado e, durante o amanhecer escapuliu da terra sem realizar
a base do contrato.
O prefeito “B” ganhou a eleição, Aurora desfilou na rua
vestida de mulher ao som de banda de música e o novo prefeito nem sabia o que
fazer para colocar a burra no colo.
Daí em diante, Aurora passou a ser procurada para tudo.
Com a cabeça, relinchos, coices e outras artimanhas, respondia às multidões como
famosa vidente dos sertões. Perguntavam sobre separação de casais, almas do
outro mundo, como deixar de beber, trazer um amor de volta e até sobre os
números da loto em que a burra de Candinho respondia batendo com os cascos no
chão a cada número perguntado. Quando um fazendeiro quis construir para ela uma
igreja, o bispo exasperou-se e mandou o delegado tomar providências. Mas, todos
que chegavam perto da burra encantavam-se com
ela.
E para
encurtar a história, certa manhã encontraram Aurora “estirada” no cercado. Nunca
souberam quem havia feito tamanha barbaridade, mas a mulher enciumada do
prefeito “B” estava de PEITO LAVADO
· Série ficção.
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