domingo, 21 de junho de 2015

Merecem Socorro: Árvores centenárias da alameda do Açude Cedro estão sendo destruídas

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Quando o Imperador do Brasil, Dom Pedro II, assinou a ordem para que a primeira barragem pública do país fosse erguida no município de Quixadá, no Sertão Central do Ceará, lá no ano de 1890, a Ficus Benjamina, da família Moraceae, já dominava imponentemente o cenário. Ao lado dos gigantescos monólitos, foram estas belíssimas árvores que recepcionaram 
os primeiros trabalhadores que chegaram ao canteiro de obras.
Se tivessem memória e pudessem falar, estas árvores seriam capazes de contar cada detalhe da história de mais de um século deste município e, mais especificamente, de tudo o que se passou durante os anos da construção do hoje internacionalmente conhecido Açude Cedro, que pode, inclusive, ser em breve indicado a Patrimônio da Humanidade.
Assim, é fácil perceber que as árvores centenárias possuem incalculável valor, não apenas de natureza histórica, mas também para o equilíbrio e preservação de toda a flora e fauna nativas. Refletindo este conceito, em 1977 a área na qual elas estão localizadas foi tombada como patrimônio de todo o povo brasileiro. Na teoria, pois, deveriam ser protegidas, conservadas e zeladas como riquezas intocáveis da nação. Na prática, porém, estão entregues ao esquecimento, desprezadas como se fossem objetos descartáveis, substituíveis e, inclusive, sem relevância para a memória e identidade popular.
CUPINS, OCUPAÇÃO HUMANA E DESCASO: AMEAÇAS CONSTANTES
Cupins
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Por dezenas de anos os isópteros, popularmente conhecidos como cupins, foram os principais inimigos das árvores no entorno do açude, e ainda são uma ameaça. Várias delas foram deterioradas ou completamente destruídas por esta ordem de insetos.
Não há notícia de que entidades governamentais tenham, em algum momento, empreendido esforços para impedir a proliferação dos cupins nas árvores que, noutros tempos, margeavam e produziam sombra ao longo da alameda que se estende desde o arco de entrada da área protegida até o acesso imediato à barragem. Em nossa visita ao local, em preparação para esta matéria, vimos de perto que algumas das maiores sobreviventes estão infestadas de cupins.
Ocupação Humana
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Outra séria ameaça à preservação não apenas das árvores centenárias, mas de toda a flora do local, é a sempre crescente ocupação humana. De fato, apesar da vedação legal à ocupação da área tombada, é cada vez maior a presença fixa de pessoas ali, com a consequente exploração do espaço e seus efeitos sobre a flora nativa.
Um exemplo típico de ocupação humana de largo impacto sobre a flora que circunda o Açude Cedro são as instalações da Universidade Federal do Ceará (UFC) e do Instituto Federal do Ceará (IFCE).
As instalações consumiram significativa quantidade de espaço da área protegida e prosseguem em expansão. As obras obrigaram à remoção de uma quantidade substancial de árvores de menor porte, diminuindo o espaço natural à fauna nativa. Como se pode ver na foto abaixo, uma das árvores centenárias, localizada na entrada das instalações da Universidade Federal do Ceará, foi cortada no tronco. Outras estão caídas ao chão após terem sido consumidas pelo cupim ou simplesmente foram queimadas depois de mortas. Todos os incêndios causados na área podem ser considerados criminosos, mas nunca foram plenamente esclarecidos.
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Consultado durante a preparação desta matéria, o Diretor Geral do IFCE, Helder Caldas, explicou que dentro da área do campus não está havendo desaparecimento gradual das árvores centenárias. “Nós preservamos todas e somente foram retiradas para a implantação dos blocos didáticos as árvores invasoras”, afirma. “Seria um contrassenso nós termos um curso de Engenharia Ambiental e estarmos fomentando a destruição das árvores nativas”, acrescenta.
O diretor da instituição ainda revela que o IFCE cultiva um viveiro que produz anualmente 60 mil mudas de árvores nativas. Segundo ele, algumas são plantadas no próprio local e outras doadas à comunidade. Apesar destes esforços anunciados, nenhuma mudança se vê no cenário de deterioração ambiental na área da alameda, fora do campus.
Exceto neste caso do IFCE, nenhuma outra instituição envolvida direta ou indiretamente no cuidado e preservação da fauna nativa do Açude Cedro respondeu nossas solicitações por informações.
Há, também, além destas instituições públicas, a exploração do espaço tombado por iniciativas particulares. Recentemente, aqui mesmo no Monólitos Post, o radialista Wanderley Barbosa denunciou a extração irregular de centenas de carradas de aterro, o que deixou uma grande cratera na área tombada, produzindo um enorme estrago no ecossistema local que, certamente, demandará muitas décadas para ser corrigido.
Descaso
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Conversamos com o Senhor Lauro (71), que há 51 anos estabeleceu residência nas proximidades da alameda, bem antes dela ser tombada. Ele e a família atualmente zelam pelas instalações de um parque de exposições de animais de criação. Ele revela que já plantou dezenas de árvores no local, mas o descaso de quem poderia fazer muito mais pela preservação da fauna nativa trabalha na contramão de seus humildes esforços.
“Isso aqui era todo coberto de árvores de um lado e de outro. Desde a entrada até lá no final, não dava nem pra ver o que tinha atrás das árvores de tão fechado que era. Era bonito demais. Mas a falta de cuidado com essas coisas boas que Deus deixou aqui acabou desse jeito aí que vemos hoje. Tudo descampado, sem cuidado, esquecido pelas autoridades”, contou ele durante conversa em preparação para esta matéria.
De fato, o descaso com a fauna nativa da alameda do Açude Cedro é gritante e, com certeza, uma das maiores ameaças à preservação das árvores centenárias.
FUTURO INCERTO 
Por todo o tratamento que as árvores centenárias da alameda do Açude Cedro tem recebido pode-se com facilidade apontar para sua completa destruição em pouco tempo. Trata-se, é claro, de um fluxo de eventos perfeitamente reversível, desde que estabelecidas as prioridades corretas. Se forem encaradas como fundamentais para qualquer futura exploração turística do espaço, talvez a proteção dos últimos exemplares da Ficus Benjamina possa ser levada mais a sério, e algum projeto de plantio continuado na alameda seja tentado.
Enquanto uma mentalidade mais compatível com a preservação ambiental não se torna realidade, Quixadá vai assistindo à lenta e gradual destruição das árvores centenárias da alameda do Açude Cedro.
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Autor: Gooldemberg Saraiva
(bergsaraiva@gmail.com)

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